Levei um susto quando, ao
esperar o portão eletrônico abrir, um andarilho bate na janela do carro e
implora por uma moeda de real... Fiquei em dúvida se aquilo era um homem
vestindo farrapos ou farrapos vestindo uma nova espécie de primata... O odor
denunciava seculares falta de banho, mas o olhar não era estranho para mim...
Estava ali, na minha frente, ele mesmo: Pedro Paulo, um colega de classe, nos
tempos do colegial!
Ele não me reconheceu e fiz de conta, apesar de assustado,
nunca tê-lo visto.
Em que parte da estrada
teria se perdido?
Fácil imaginar... Passou a vida debruçado sobre a influência e status do pai, então delegado "calça-curta" da cidade... A fonte deve ter secado...
Fácil imaginar... Passou a vida debruçado sobre a influência e status do pai, então delegado "calça-curta" da cidade... A fonte deve ter secado...
E onde estaria o carrão do ano, que ostentava com apenas 17 anos de
idade? Carrão que sugestionou seu apelido: Pedrinho Maverick! Um Ford Maverick,
branco, pneus tala larga, volante Phanter e toca-fitas Roadstar auto-reverse!
Morríamos de inveja... Mas suas coisas, alimentavam nossa
ilusão estudantil, no fundo queríamos ser como ele!
Agora está aqui, verdadeira tragédia social, de joelhos,
implorando migalhas, enquanto abro a porta do carro.
Não usa mais calça Lee, jaqueta de couro, tênis Rainha... O Stiletto deu lugar a esse fedor que agora emana... Triste decadência de um playboy que, por vezes, pelo retrovisor nos olhava com alardeado desdém... Nós, simples miseráveis!
Não usa mais calça Lee, jaqueta de couro, tênis Rainha... O Stiletto deu lugar a esse fedor que agora emana... Triste decadência de um playboy que, por vezes, pelo retrovisor nos olhava com alardeado desdém... Nós, simples miseráveis!
Reflito e concluo que não é
hora de questionar antigas ostentações... Está aqui, deplorável, um sujeito que desceu do Maverick
e entrou na garrafa de Jhonnie Walker que trazia no porta-luvas.
Do whiski importado, desceu para o último patamar... Nem para a pinga mais barata, disponível nos botecos, tem recursos...
Do whiski importado, desceu para o último patamar... Nem para a pinga mais barata, disponível nos botecos, tem recursos...
Me identifico, ele baixa a
cabeça e, envergonhado, vira-se para partir... Não permito, sem antes entregar-lhe 50 reais... Naquele instante eu devolvia-lhe o dinheiro que pagou para
ter seu nome incluso nos meus trabalhos escolares, trabalhos que o desocupado
não contribuiu com uma vírgula sequer, e eu, levianamente - pela necessidade -
aceitei!
Eu ficaria feliz se, com
esses 50, ele comprasse a passagem de volta para dentro de si, e quem sabe, para
a vida!