Naquela época os mantimentos eram
escassos: o arroz era contado, o feijão era contado, o café era contado, enfim,
não havia sobras nem desperdícios. Papai trabalhava de carpinteiro e os recursos
eram minguados. Só se comprava mantimentos por quilo, portanto, o açúcar que se
comprava pela manhã era consumido até o final do dia, afinal, eram treze bocas
para comer, dez das quais menores de idade!
Apesar das dificuldades, havia em
nossa casa, respeito, organização e hierarquia, além da disciplina no horário
das refeições. Sabíamos, também, das dificuldades para a compra dos alimentos
diários.
Naquela terça-feira, após um temporal assustador durante a madrugada - até as aulas foram canceladas por causa do volume das chuvas. Ficamos todos em casa. O dinheiro
que o Zizo (sempre lutador!) recebera, pelo corte de cana, no dia anterior, foi usado para comprar:
meio quilo de arroz, duzentos gramas de açúcar e duzentos gramas de café moído.
Como de costume a Dorinha ficou
incumbida de fazer um bule de café e a Regina o arroz. A Dorinha colocou no
fogo a água já adoçada para fazer o café, esperando ferver para passá-la no coador
de pano, enquanto isso foi varrer a varanda. A Regina, após arrumar os quartos,
veio refogar o arroz. Desatenta, percebe uma caneca com água fervendo na outra
boca do fogão e a despeja dentro da panela com o arroz.
Dá para imaginar o que
aconteceu?
Ao ver que a água doce foi
utilizada no arroz a Dorinha começa a chorar compulsivamente, a Regina do outro
lado grita em desespero: - Que desgraça! Que desgraça! Nós mais novos, também
abrimos nosso choro, mas, um choro contido e silencioso! Minha mãe entrou
correndo, também desesperada, tentando salvar a refeição do dia. Tudo perdido -
nem café, nem arroz!
Ainda fizeram uma tríplice lavagem para tirar o doce do arroz, nem deu! Minha mãe dobrou o sal e o temperou, outra tentativa frustrada, virou um grude e ficou com um gosto insuportável!
Ainda fizeram uma tríplice lavagem para tirar o doce do arroz, nem deu! Minha mãe dobrou o sal e o temperou, outra tentativa frustrada, virou um grude e ficou com um gosto insuportável!
Naquele dia pensei que minhas
irmãs morreriam de tanto apanhar, mas mamãe, sempre justa, sequer ergueu um
dedo para puni-las. Diante daquele fato comecei a compreender a grandiosidade
do caráter de minha mãe.
Hoje lembramos daquele ocorrido com
bom humor – a miséria ficou pra trás – a fome ficou pra trás - a chuva também passou! E eu, se chorei,
já me esqueci!
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