segunda-feira, 28 de maio de 2012

HELENA



 Não pensem que, com este título, vou escrever sobre o romance de Machado de Assis ou Helena de Tróia - de Homero... Tampouco escreverei sobre as “Helenas” do novelista Manuel Carlos.

 Escreverei sobre a minha Tia Helena, filha da Biela e do Zico, irmã de papai e esposa de Octacílio.

 Tia Helena sempre chamou a atenção pela elegância, educação e fineza... Além dos perfumes florais, toda vida, exalou altivez, ares de primeira-dama e atitudes de grande mulher.

 Outro dia ouvi alguém dizer que: 

- Quando desenhares uma flor desenhe-a ao desabrochar... Pois é, ao mesmo desenhista sugiro que, quando desenhar Tia Helena desenhe-a com sorriso no rosto, não um sorriso qualquer, e sim, um contagiante e escancarado sorriso, desses de quem tem Deus no coração. 

 Essa é a imagem que sempre tive da Tia Helena - uma mulher com um grande sorriso no rosto! O desenhista não pode esquecer de traçar, também, um brilho confortante no olhar e, se conseguir, desenhar e pintar com várias nuances de tom sobre tom, muita bondade na alma.

 Tia Helena tinha a casa mais confortável de Santa Cruz, não digo conforto material ou objetos decorativos, falo de aconchego, carinho e alegria.

Eu deveria ter ido mais vezes na casa da Tia Helena, me sentia bem quando ia lá, e olha que não estou falando das generosas mesas de café - sempre considerei um lugar de paz. Até o canto dos canários, dependurados na parte baixa da casa, soavam alegre naquele ambiente – a primeira casa da Rua Quintino Bocaiuva.

 Poderia os desinformados julgarem que tanta bondade, paz e alegria estariam diretamente ligadas à ausência de dificuldades e preocupações... Muito pelo contrário, tenho certeza que Tia Helena teve lá suas angústias, noites sem sono e lágrimas contidas. 

 Foi ela quem cuidou do Vô Zico e do Tio Octacílio nas suas fases derradeiras, fases em que o amor tem que ser maior que a própria dificuldade. O mesmo amor e união, comoventes, demonstrados por aquela família, a vida toda, para uma menina com necessidades especiais. Deus só poderia ter confiado esta tarefa para uma família especial – a família da Tia Helena!

 Nossa distância geográfica não apagou essa observação, simples assim, para que fique registrada, eternamente, minha admiração!


domingo, 13 de maio de 2012

BRASÍLIA AZUL 74



Algumas folhas secas corriam nas quebradas das ruas, de canto a canto, anunciando um outono rigoroso.

Não sabíamos que rigorosa, também, seria nossa passagem por Mandaquari. E foi! Ficamos sem eira nem beira naquele fim de mundo. 

Fonte de recursos, única, foi uma oficina de conserto de calçados que o Zizo montou naquela cidade.
Mas o que fazer com pouco mais que dois cruzeiros, por dia, para cuidar de 10 irmãos? A fome foi inevitável.

A esperança renasceu, na nossa casa, no dia em que o Zizo, não suportando tanto sofrimento, chegou à tarde, chorando e disse:

 - “Vamos embora dessa desgraça!”

O José e a Conceição, os irmãos mais velhos, todos foram unânimes – tínhamos que tentar a sorte em outro lugar, esse lugar foi Ourinhos. Ali passamos outros anos de miséria, o Zizo, sempre o Zizo, continuava dando o exemplo. Além de cortar cana, fazer serviços de carpintaria empregou-se numa empreiteira de serviços de energia elétrica. De tão bom funcionário, o patrão (Zé Gordinho), empregou também, o Alair e o Paulão pensando que fossem tão bons quanto o Zizo.

E assim ele seguiu sendo exemplo para todos nós. Lembro-me do dia em que precisei de dinheiro para a matrícula no exame de admissão - foi o Zizo que me socorreu.

Ele semeou o exemplo e seguiu para a capital paulista buscando melhores dias. Ficamos algum tempo sem vê-lo. Era um filho tão especial que escrevia contando as novidades. Ele sempre iniciava suas cartas com a citação:

- “Queridos pais e irmãos”, ou seja, o respeito estava no sangue. 

Era uma felicidade geral quando anunciava, nas suas escritas, que vinha nos visitar. Sabíamos que a mesa ficaria farta e teríamos melhores Natais.

Numa manhã de primavera apareceu irradiando alegria, em casa, dirigindo uma linda Brasília Azul 74, placa EY 5679. Era o troféu para o sujeito mais lutador dos irmãos, mais humano dos irmãos, ou seja, mais irmão dos irmãos.

Não é preciso dizer que venceu as batalhas da vida e sua vitória nos faz acreditar que nunca devemos deixar de lutar.

O cara é foda!