domingo, 26 de janeiro de 2014

JOÃO E FLÁVIA NA TERRA DOS COLIBRIS

Quantos atropelos, quanta correria desnecessária a ponto de canibalizar momentos. Nem, ao menos, prestei atendimento emergencial, e esses momentos ficaram para trás, agonizantes, enquanto eu segui minha correria desenfreada. Corria tanto que, às vezes, me faltava fôlego.

Ocorre que somos mutantes... Não falo dos mutantes dos filmes de ficção, que ejetam monstros de tudo que é poro... Somos mutantes na versão 'revisão dos conceitos': adaptáveis, recicláveis, ajustáveis e passíveis de adequação.

Eis que chega a metamorfose pretendida... Momento da pausa, do respirar profundo, do sentir a brisa escorrendo telhados e da chuva beijando vidraças.

Agora estás aqui... Hora de ‘curtir’ a vida e compartilhar a posse definitiva da felicidade. Não corro mais, encontrei o lado que me faltava... Hoje saboreio e calculo cada passo, experimento seus passos, piso com eles. No instante em que mudas o passo, as coisas passam, nossos passos passam, siameses - lado a lado, e deixam pegadas no cimento molhado.

Eu, ainda lagarta, te convido a me ensinar voar, borboleta. Minha vida agora é sua, vamos sair por aí e surfar nossos sonhos... Vamos flanar por rios de espuma, caminhar avenidas e colher sempre-vivas. Sinta minha mão na tua mão... Percebe? Está viva, deliciosamente viva!

Agora, encoste sua cabeça no meu peito, vou fazer silêncio, prometo... Ouça apenas o batuque do meu coração: tum-tum  tum-tum  tum-tum...

domingo, 19 de janeiro de 2014

MONUMENTO AO DOMINGO

Amanheci disposto a criar meu ‘monumento ao domingo’... Sairei pelas ruas com meus pincéis e espátulas, sem preocupação com formas ou influências, nada de Brecheret, tampouco Renoir... Um ‘monumento ao domingo’ inteiramente meu, só meu.

Uma obra deste quilate carece um toque pessoal, independente do material utilizado... Um domingo em tela gigante, com meus exclusivos tons, ainda que eu opte por cores brilhantes e metalizadas, mas, que seja um domingo que evidencie somente minha aquarela... Um domingo moldável em argila ou ferro gusa, porém moldável, palpável, admirável e multicolorido.

Idealizei um domingo sem internet, sem compromissos, sem celular e sem plantões... Um domingo de causar inveja à beira do rio ou à paisagem na janela... Um domingo do céu com o mais puro azul entre todos os azuis, mas azul! Um domingo onde eu gaste toda tinta amarela no seu sol, que refletirá nas flores, onde as joaninhas, até então donas do caleidoscópio, fiquem vermelhas de inveja.

Meu ‘monumento ao domingo’ não pode ter música... Pode apenas emanar o som do silêncio, para que possamos ouvir suas cores e refletirmos sua melodia... Um domingo sem opiniões, conclusões ou julgamentos, um domingo de vários sons, tons e nuances.

Posso até esculpir um simples cavalo-alado para simbolizar a leveza do domingo, mas que nada, cavalos-alados não denotam leveza... Preciso de um domingo que transmita a presença de Deus!

Esculpirei, então, milhares de origamis, em papel crepom branco, e os semearei pelo céu, para que voem em “V”, desafiando a resistência dos ares, e possam bater continência para as dobraduras da lua, escondida por detrás da camisola de renda lilás!

O pôr do sol, eterno espetáculo gratuito, terá um tom alaranjado, com direito a sombras horizontais e horizontes infinitos. Posso até pontilhar alguns pássaros procurando seus ninhos, desde que não façam algazarras.

Para encerrar, meu “monumento ao domingo”, pintarei a noite com o mais sombrio lápis preto, exatamente como deve ser pintada a noite. Mas não tomarei gosto pelo desgosto, nem deixarei a tristeza tomar conta da escuridão... Salpicarei alguns pontos prateados, na negritude, para que nunca deixem de admirar o brilho das estrelas!




sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

ROLEZINHO CULTURAL

Mesmo sabendo que nada sou para propor coisa nenhuma, atrevo-me sugerir um “rolezinho” pelas bibliotecas da cidade... Proponho, um arrastão pelas lojas de discos ou sebos... Quem sabe a gente dê de cara com Mário Quintana, Clarice, João Ubaldo, Santana Filho ou Alcir. 

Quem sabe a gente encontre, na prateleira mais escura e escondida, algum vinil empoeirado do Belchior, Montenegro, Leoni, Ivan Lins, Guilherme Arantes, Zé Geraldo ou Antônio Carlos e Jocafi.

Quem sabe, num antiquário, uma camisa tacheada do Elvis, o cabelo meia-tigela dos Beatles, ou, os óculos à lá Chico Xavier do Roy Orbison.

Proponho uma releitura de “Alice no País das Maravilhas”... Que país é esse, Lewis Carroll? Ou seria melhor perguntar pro Renato Russo?!

Proponho um mergulho no ‘Retrato’ de Cecília Meireles e que, nossa imagem refletida, responda em que espelho se perdeu a vergonha na cara!

Proponho um “rolezinho” pelos cinemas... Quem sabe esteja em cartaz, em algum shopping do esquecimento: “Em Algum Lugar do Passado”, “Mente Brilhante”, ou, “Assim Caminha a Humanidade”...  Mesmo sabendo que a humanidade caminha para a desintegração e anunciada queda no abismo da ignorância e desinformação.

Proponho que, nesse “rolezinho”, se leia muita poesia... Pode ser Drummond, Vinícius, Leminski, Helena Kolody, ou, o grande cordelista Leandro Gomes de Barros, mas, que se leia poesia.

Nossa mente está engazopada de tanto lixo que as poderosas mídias nos enfiam goela abaixo... Estamos desacursuados e enfadados em ouvir BBB.

Duvido que ao escutar Paulinho Tapajós - ler Casimiro de Abreu ou assistir algum filme baseado em obra de Ariano Suassuna, “O Auto da Compadecida”, por exemplo - não se vislumbre uma luz no fim do túnel!

Proponho o “rolezinho” e tenho certeza que, dentro dos livros, encontraremos descrições maravilhosas, cenas marcantes, personagens inesquecíveis: Riobaldo e Diadorim, Capitão Rodrigo Cambará e Bibiana Terra, Ceci e Peri, Chicó e João Grilo e etc..

Se não quiserem aderir à proposta do “rolezinho cultural”, tudo bem, só pensei em algo palpável, que tivesse rumo ou norte e quebrasse os cristais do vandalismo... São apenas sugestões de um ex engraxate, pobre de marré deci, magrelo, e que, algum dia, ousou sonhar a educação e a poesia como salvadoras do mundo!

Sou sonhador, só isso!



segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

VERBOS



Sairemos...

Caçando pegadas, proteção de fadas
Pegaremos estradas, fugiremos pro nada
Com azar ou com sorte, zombaremos do medo
Fugiremos da morte, sem cismas, segredos!

Escalando montanhas, antenas e postes
Escreverei só poemas... cavalos, seus trotes
Se chuva cair folhas, flores murchas no chão
Terra firme segura... os pés, ilusão!

Pagando promessas, quebrando a esquina
Dobraremos origamis... a dor, aspirina
Evitando o fracasso, glosaremos excesso
Exceder o impossível... se possível, sucesso!

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

"GUERRA É PAZ NA ESTRADA"

Não raramente, quando saímos em viagem rodoviária, além do trânsito, placas, asfalto, pneus, boa música no mp3, paisagens e outdoor's, vez ou outra, e por longo trecho, nos vemos travados atrás de veículos lentos, principalmente carretas.

Especialistas em segurança no trânsito sugerem, nesses casos, atenção redobrada e paciência... E haja paciência, aliás, as crianças, desde os primeiros quilômetros brigam por espaço no banco traseiro, tomam coca-cola com um 'chips' de cheiro insuportável, o tal "Cheetos". Além disso, perguntam insistentemente se ainda vai demorar, ufa!

Pois bem... Dia desses vivenciei esta situação, entre Ibaiti e Ventania, por mais de 10 quilômetros, atrás de uma carreta graneleira... Nas descidas o cheiro de lona de freio queimada era constante, assim como, o ruído dos “frenos de aire” (é assim que estava escrito!), que chiavam feito uma panela de pressão.

Deu tempo para analisar o “slogan”, do fabricante da carreta, estampado no vinil que cobria a carga: “Guerra é paz na estrada”... Que criatividade! Que trocadilho fantástico com os substantivos guerra e paz, tão concreto quanto abstrato... Tá certo que a “Guerra” citada, quase certeza, tem a ver com o sobrenome, de origem italiana, do fundador da empresa fabricante das carretas, mas ficou legal!

O enunciado do slogan é claro: Adquirindo produtos Guerra, você terá paz na estrada!  A isto os especialistas chamam de: confiança no produto que fabrica, simples assim!

Bacana a atitude do motorista da citada carreta... Quando percebeu que, o “cortejo” que o seguia, poderia ultrapassá-lo com segurança, acionou a seta da direita, deu uma diminuída e com o braço esquerdo sinalizou com o gesto característico de ultrapassagem... Recebeu, em agradecimento, quase uma dúzia de dois toques breves nas buzinas.

Diante do comportamento do carreteiro, e pegando carona na frase do fabricante, fica a sugestão: Cortesia é paz na estrada – sempre!

Boas férias pra vocês!



domingo, 5 de janeiro de 2014

NOTÍCIAS DE SANTA CRUZ

Não lembro bem, mas era maio, ou abril, do ano de 1921... Os ventos de outono varriam algumas folhas secas, no entorno da plataforma de embarque, da recém-inaugurada estação ferroviária de Santa Cruz do Rio Pardo... Eu, atento, observava aquele movimento com olhar surpreso.

Talvez, aquela alternativa de transporte, criada para escoamento da produção do “ouro verde”, trouxesse o desenvolvimento para este canto do Estado paulista.

Continuei ali, com meu impecável terno de linho branco e chapéu Prada, esperando ouvir o primeiro apito do trem sorocabano deslizando pelos trilhos santacruzenses.

Os charreteiros em fila, não menos ansiosos, aguardavam os passageiros para transportar suas bagagens, ou, alguma cafetina paulistana, disposta a iniciar atividade na cidade joia, trazendo consigo uma meia dúzia de damas da noite.

As autoridades presentes se acotovelavam diante dos trilhos, ainda cheirando tinta: Coronel e Prefeito Antônio Evangelista da Silva (Tonico Lista), “Pharmaceutico” João B. Martins, Oficial de Justiça Ataliba Santos Baptista, “Collector” de impostos Manoel Novaes Cortez, Dr. Jonathas Bonfim, Pároco Nelson Luiz, entre outros.

Eu não podia perder aquele evento grandioso, mas, não tirava os olhos do, interessantíssimo, jornal “Cidade de Santa Cruz”, mesmo sendo distraído, às vezes, pela matraca do vendedor de bijus e por um ébrio que insistia em chamar as charretes, ali estacionadas, de “balaio de putas”!

O jornal continha as mais variadas publicações, desde anúncio de vermífugos milagrosos, e antipesos no estômago, até editais de proclamas, casamentos, intrigas e, pasmem, uma proposta de troca de 3740 metros quadrados na Saúde, em São Paulo, por uma chácara em Santa Cruz (esta proposta, hoje indecorosa, dava a medida exata do valor, de então, das terras santacruzenses!).

Até me esqueci da inauguração das atividades ferroviárias quando li uma “declaração de acerto de contas”, na qual, um tal Dorvalino, cabra honesto toda vida, que, diante da dúvida do patrão, não hesitou em pedir demissão, além de publicar os números de uma venda de gado e assumir, inclusive, o ônus de valores recebidos antecipadamente.

Cansei de esperar o trem, fechei o jornal e fui embora deixando pra trás aquela muvuca... Nem dei conta quando a menina, de vestido de cambraia amarelo, que me lançava olhares fatais, foi embora a bordo de um “balaio de putas”... Deixou apenas seu perfume de lavanda  e, desapareceu junto com o barulho das ferraduras batendo nos paralelepípedos.