sábado, 23 de março de 2013

DO DESIGN GENIAL À TECNOLOGIA ULTRAPASSADA



Nessa manhã, caminhando na esquina onde foi o Cine Peduti me lembrei de um filme de ficção que aqui assisti, há muito tempo: 

“2001 - Uma Odisseia no Espaço”. 

Na época, o Diretor Stanley Kubrick, deixou um baita ponto de interrogação em nossas cabeças: " - qual será o próximo passo para a evolução humana?", além disso, nos fez refletir e questionar qual o limite da mente. 

Enquanto viajo no filme, e no tempo, começa um chuvisqueiro e me escondo sob um orelhão, bem na esquina da matriz. 

 Minha cabeça sai do filme e, literalmente, entra na criação, não menos genial, da arquiteta, nascida em Shangai, naturalizada brasileira, Chu Ming Silveira, criadora do abrigo que agora me acolhe: o orelhão. 

Com uma ideia na cabeça e, um grafite na mão, Chu Ming percebeu que era, apenas, questão de “design” e em 1972 cria os “orelhões”... No formado “concha acústica” sua criação se esparramou pelo mundo. 

E quanta utilidade teve a criação da arquiteta???!!!

Havia administrador público que anunciava, em rede nacional, que em seu município havia um orelhão a cada cem metros... Era a comodidade em benefício da população, entre outras balelas!

Como a tecnologia é mais veloz que o pensamento, e o que é moderno logo se torna pré-histórico, entram em cena os aparelhos celulares.

Ah, os aparelhos celulares! Decretaram o fim dos fantásticos “orelhões”... O vandalismo e o desleixo das concessionárias de telefonia também tiveram suas parcelas de culpa nesse “assassinato”.

Ratificando, sem trocadilhos, os orelhões respiram por aparelhos. A Anatel fala em desativá-los até a Olimpíada do Brasil. Na verdade, preparam o enterro (simbólico) de um equipamento que faleceu faz tempo.

A criação de Chu Ming, sinceramente, merecia um final mais honroso!


quarta-feira, 13 de março de 2013

O LOUCO SOU EU!


Ando um tanto desinteressado por teorias e tentativas de entendimento da mente humana, e da minha também!

Com a cabeça cheia de interrogações, indecisões e incertezas, eu, como a maioria dos mortais, não consigo entender como um advogado pode comemorar, aos sorrisos, a pena de 22 anos que seu cliente, famoso, acaba de levar no lombo.

Outro “nobre colega”, aparece na delegacia, com seu cliente a tiracolo, e afirma:

- Meu cliente é o culpado... Ele acionou o sinalizador que matou o boliviano... Vamos provar tudo! 
  
Não precisamos estudar direito penal para saber que: advogados são contratados para inocentar seus clientes, não para “fudê-los”. Ou esses “defensores da justiça” são loucos ou terei que reimplantar, urgentemente, meu estimado par de orelhas de burro.

Minha mente insiste em borrifar apenas fumaça preta do alto da torre. A minha indecisão gera ansiedade na multidão sentada na calçada da minha casa. Essa multidão corre o risco de que eu apareça na sacada, e grite: - Habeo sacculum cheius!.

Enquanto todos aguardam o final do meu conclave, para que a chaminé bufe fumaça branca, eu tento, da maneira que melhor me convém, usar os ingredientes disponíveis para fazer bolo de chocolate, não importando se esse bolo sairá com gosto de bambu rachado ou de carro importado mergulhado na represa.

Assistindo a tudo, de queixo caído, espero que a dirigibilidade melhore antes do Natal, e que o Google Maps mostre um caminho melhor para os venezuelanos. Vai que o presidente morto cisme em se candidatar a Papa. Aí o capim comerá o boi e as crianças geradas no carnaval nascerão sob o signo de touro.

A ameaça de caos, e a falta de patrocínio no meu uniforme, me faz lembrar alguém que não conheci e algo que não vivi, e antes que o mundo acabe comprei, via 'mercado livre', uma camisa de força azul turquesa, minha cor preferida.

Aqui, na avenida ao lado, estão elegendo 43 Papas por dia! Haja fumaça!

O louco sou eu!


segunda-feira, 4 de março de 2013

O SAPATEIRO DA RUA BRASIL


O cadeirante Angelim, além de sapateiro, era uma fabulosa “enciclopédia” humana... Fonte de nossas consultas didáticas. Ele, criterioso, não resolvia nossas tarefas escolares: ensinava-nos como fazer. Angelim foi, sem medo de errar, a pessoa da mais avançada cultura geral que conheci... Com a mesma propriedade com que resolvia uma simples “regra de três” interpretava as ideias de Gregório de Matos e discutia Mikhail Bakunin.

Tinha algumas manias o Angelim... Extremamente organizado e metódico, os calçados de sua oficina eram dispostos por tipo (botas com botas, botinas com botinas, sapatos com sapatos, etc.), tudo etiquetado e identificado. Após o almoço quando retornávamos da escola o observávamos cochilando, sobre sua cadeira, atrás de uma mesinha baixa cheia de tachinhas nas divisões, invariavelmente, com um livro caído sobre o peito.

Minha amizade com o, bem-humorado, “mestre” Angelim teve início em 72, quando pediu para que eu fosse, até a Farmácia Arruda, buscar seu coquetel de remédios... Acometido por uma paralisia congênita nos membros inferiores, cresceu sobre uma cadeira de rodas, pesadíssima, aliás. Aquela cadeira parecia uma extensão do seu corpo, tal era sua destreza com o equipamento...  Parecia levitar sobre rodas. 

Fumante inveterado, respirava com dificuldades, era  hipertenso e tinha problemas circulatórios. Sua condição orgânica nunca limitou o exercício de sua profissão; era o melhor sapateiro da cidade. 

Jamais reclamou de suas limitações, ao contrário, apoiava-se em Deus e afirmava que a sua vida já era um presente  do Criador. 

Produtivo, competente e independente era avesso ao uso dos benefícios sociais disponíveis... Era, terminantemente, contra aposentar-se com "saúde". 

A escola onde estudávamos (Virgínia Ramalho) realizava anualmente uma gincana inter-séries, chamada: “Gincana do Conhecimento”. Os desafios, além de algumas tarefas filantrópicas, era levar uma pessoa da comunidade para responder perguntas de cultura geral. Naquele ano convidamos o Angelim para nos ajudar. Reticente e desconfiado ele titubeou, mas, acabou por aceitar nosso convite (na verdade foi uma intimação!). Entre médicos, advogados e outros profissionais liberais, Angelim deu um verdadeiro “show” de conhecimento, acertando todas as 50 perguntas do questionário apresentado. Colocou 18 pontos de vantagem sobre o segundo colocado. E pensar que quando entramos na sala da prova, empurrando sua barulhenta cadeira de rodas, percebemos um quê de desprezo e olhares jocosos atirados na direção do nosso mestre.

No ano seguinte Angelim despediu-se da vida, serenamente, e da maneira que mais gostava: com um livro semiaberto no peito. Durante seu cochilo vespertino, “Seu” Angelim, seguiu a viagem definitiva... Deus o chamou, havia uma vaga de anjo no céu!

Hoje Angelim deve estar levitando no Paraíso... O único lugar onde, as cadeiras de rodas são desnecessárias, os sorrisos são doces e os olhares não discriminam, ao contrário, acalentam!


sexta-feira, 1 de março de 2013

OS TRILHOS DO TEMPO


Estive ontem em Marques dos Reis, um patrimônio ao lado do Rio Paranapanema, da BR 153, além da linha férrea da Rede Ferroviária Federal, na divisa entre São Paulo e Paraná.

Naquele trecho vivenciamos algumas das nossas mais perigosas aventuras juvenis... Nosso desafio era pegar rabeira nos trens de carga, na estação de Ourinhos, descer na estação de Marques dos Reis e mergulhar no Panema, despencando da ingazeira do Diacuí... Aquilo era nossa Disneylândia, o melhor dos mundos!

Se era perigoso subir num trem em movimento, imagine saber que, quando da nossa chegada no pátio da estação de Marques dos Reis, íamos dar de frente com Sr. Ananias: mecânico/chefe da RFFSA... Camisa aberta, chapéu borsalino e faca na cinta, ele cuidava daquilo como se fosse sua própria casa... Pensa num homem bravo!

Hoje, tudo está no mais completo abandono, silencioso, soturno, em ruínas. 

Não vimos nem ouvimos o velho Ananias (senti falta dos seus berros: - Lá vêm os capetas!). Nem sua casa existe mais... As casas da vizinhança estão castigadas pela ação do tempo, se deteriorando, também!

Os vagões-oficina permanecem no mesmo lugar, porém, se desintegrando pela ação do tempo, ah o tempo!

As fadas que pairavam no local foram embora, e levaram consigo as flores e os bandos de borboletas azuis.

As olarias, ao redor, parecem emanar a mesma fumaça de 40 anos, entretanto, não conseguem disfarçar a tristeza escorrendo por suas chaminés.  Quem sabe sentem saudades dos meninos que dependuravam nos vagões, talvez saudades dos trens de passageiros que viraram peças de museu! Aquelas chaminés documentaram que fomos felizes...

As mangueiras e goiabeiras, às margens da ferrovia, continuam por lá, resistiram ao tempo, até aumentaram em razão dos pássaros que esparramaram suas sementes - por entre os dormentes - naqueles caminhos, hoje dormentes.

O mais triste foi encontrar tudo acabado, parado, com a respiração ofegante, sem perspectiva de se chegar a nenhuma nova estação.

Melancólico voltei para casa, mas antes tive que deixar minha contribuição na gananciosa e dispensável praça de pedágio que, feito cão de guarda, bloqueia a passagem com intuito de engordar o bolso dos novos donos da estrada.

Nós, os meninos dos vagões, ainda que no imaginário, permaneceremos donos da ingazeira, donos dos trilhos, donos do tempo, da fumaça e da vida!