quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

CARBURADORES



Conheci há cerca de 30 anos, um mecânico de carros chamado Zulmiro... Rapaz jovem, mais ou menos 25 anos de idade. Sua oficina vivia abarrotada de veículos para manutenção.  Zulmiro era especialista em regulagem de carburadores.

 Até as concessionárias mandavam veículos para o Zulmiro, em virtude de sua competência, eficiência e pontualidade...  Fazia a regulagem “de ouvido”, afirmavam. Era o melhor da região, diga-se.

 Ocorre que  os veículos, nos anos 80, passaram a ser produzidos com uma nova tecnologia  de alimentação: a injeção eletrônica! Zulmiro não se deu conta disso, aliás, não acreditou nessa novidade, até desdenhou: 

- Não vai dar certo!

 Teve concessionária que ofereceu ao Zulmiro o curso de injeção eletrônica, na montadora, gratuitamente, incluindo despesas de viagem, hospedagem e alimentação. Ele dispensou o convite, pra dizer a verdade, ignorou sem dar satisfação!

 Passados alguns meses, as concessionárias, por conta da injeção eletrônica, não mais procuraram os serviços do Zulmiro. Acreditava ele que os veículos com carburadores convencionais garantiriam trabalho para o resto de sua vida.

 Os anos se sucederam e os serviços foram diminuindo, paulatinamente... O profissional percebeu intervalos na sua jornada diária.  

Nesses intervalos Zulmiro começou a dar umas fugidinhas até o bar da esquina.

Errada decisão! 

Desmotivado e desanimado tornou-se alcoolista - viciado... Depois de algum tempo, passou a fazer o caminho inverso e, vez em quando, dava umas fugidinhas do bar da esquina para executar algum trabalho.

Iniciou, então, sua coleção de fracassos. 

 Perdeu a confiança e a credibilidade, por consequência,  a freguesia e o trabalho. Vendeu seu carro e sua casa, a mulher foi embora não se sabe pra onde, levando os filhos.

 O último contato do grande profissional com sua oficina, foi  a venda do seu ferramental para um ex-funcionário... O dinheiro arrecadado foi consumido, rapidamente, com os cotovelos  apoiados nos balcões dos bares. 

 Após infindáveis tropeços e internamentos, numa manhã chuvosa,  no mês de sagitário, foi encontrado morto ao lado de um banco de concreto, na praça da Santa Casa. Seu corpo, em decúbito ventral, vestia uma roupa velha, imunda, rasgada  e  com marcas envelhecidas  de graxa. 

 Só não foi enterrado na condição de indigente em virtude de um cartão de visitas, antigo, quase ilegível,  encontrado no bolso de trás de sua calça - com os dizeres: 

"Mecânico  Zulmiro – Especializado  em Regulagem de Caburadores – Avenida da Saudade s/n".


2 comentários:

  1. A Folha de Londrina tem um espaço de quarta feira na Folha 2 chamado CRÔNICA . Um espaço democrático que nos possibilita apreciarmos crônicas fantásticas. Esta realmente foi uma das melhores que já li nesse espaço .
    Parabéns João
    Alcir

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  2. Parabéns pela crônica... pena que é muito triste mesmo.

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