quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

ÉRAMOS TREZE


 Todo dia, por volta das dez e meia da manhã, após ouvirem o horóscopo do dia - com o Omar Cardoso - minhas irmãs mais novas, Regina e Dorinha, iniciavam os preparativos para o almoço.

 Naquela época os mantimentos eram escassos: o arroz era contado, o feijão era contado, o café era contado, enfim, não havia sobras nem desperdícios. Papai trabalhava de carpinteiro e os recursos eram minguados. Só se comprava mantimentos por quilo, portanto, o açúcar que se comprava pela manhã era consumido até o final do dia, afinal, eram treze bocas para comer, dez das quais menores de idade!

 Apesar das dificuldades, havia em nossa casa, respeito, organização e hierarquia, além da disciplina no horário das refeições. Sabíamos, também, das dificuldades para a compra dos alimentos diários.

 Naquela terça-feira, após um temporal assustador durante a madrugada - até as aulas foram canceladas por causa do volume das chuvas.  Ficamos todos em casa. O dinheiro que o Zizo (sempre lutador!) recebera, pelo corte de cana, no dia anterior, foi usado para comprar: meio quilo de arroz, duzentos gramas de açúcar e duzentos gramas de café moído.

 Como de costume a Dorinha ficou incumbida de fazer um bule de café e a Regina o arroz. A Dorinha colocou no fogo a água já adoçada para fazer o café, esperando ferver para passá-la no coador de pano, enquanto isso foi varrer a varanda. A Regina, após arrumar os quartos, veio refogar o arroz. Desatenta, percebe uma caneca com água fervendo na outra boca do fogão e a despeja dentro da panela com o arroz. 

 Dá para imaginar o que aconteceu? 

 Ao ver que a água doce foi utilizada no arroz a Dorinha começa a chorar compulsivamente, a Regina do outro lado grita em desespero: - Que desgraça! Que desgraça! Nós mais novos, também abrimos nosso choro, mas, um choro contido e silencioso! Minha mãe entrou correndo, também desesperada, tentando salvar a refeição do dia. Tudo perdido - nem café, nem arroz! 


Ainda fizeram uma tríplice lavagem para tirar o doce do arroz, nem deu! Minha mãe dobrou o sal e o temperou, outra tentativa frustrada, virou um grude e ficou com um gosto insuportável!

 Naquele dia pensei que minhas irmãs morreriam de tanto apanhar, mas mamãe, sempre justa, sequer ergueu um dedo para puni-las. Diante daquele fato comecei a compreender a grandiosidade do caráter de minha mãe.

 Hoje lembramos daquele ocorrido com bom humor – a miséria ficou pra trás – a fome ficou pra trás - a chuva também passou! E eu, se chorei, já me esqueci!

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